08 maio 2014

Via Parabola

No meio dos cavalos, das cinquentinhas, das bicicletas, puseram a TV. O sol e a poeira atrapalhavam a imagem, mas alguém puxou uma lona e, com duas estacas, resolveram.
Ermo que só a “antena parabola” (“deve ser especial pra Copa”) numa fazenda no morro alcançou pouco antes. E a venda – fumo, doces, queijo, cachaça – recebeu, na estreia, os que ali vagavam, passavam ou viviam, uns trinta sem-alma.
“Brasil e quem?”. Silêncio. “Esse time aí, de branco, é qual?”. “Tá escrito ali embaixo: Croácia”. “Onde é isso?”. Silêncio. Tabefes nos mosquitos.
Ficaram em pé no hino, o velho com a mão no peito.
“Hein?”. “Ssshhhiu!”. “Lá pros lados da China”.
Na hora do gol, o dono da venda foi apertar a buzina do jipe sem vida.
“Mas branquelos assim? De olho claro?”.
O outro gol justificou o caramuru e as batidas de vergalhão no tambor. No fim, uma talagada pros adultos, geleia de três cores pros menores.
Estrada afora. “Sei não. Eles tinham mais cara de americano”.
Na cama, o suspiro: “no resto eles mandam. Mas na bola é Brasil!”.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)