07 setembro 2014

Parada

- Põe o Parada.
- Quê?!
- Por que não?
O apelido vinha da sua data de nascimento: 7 de setembro. Quando pequeno, era feriado, tinha desfile, festinha, presentes. Nos ombros do pai, batendo palma. Banda, cavalos, canhões, soldados, balas, umbelas, brilhos, bolos, embrulhos.
Um dia de aeiou! E ainda tinha os parabéns!
Nunca deixou de ir. De primeiro, desfilando pela escola, às vezes no repique. Depois, na calçada, na ponta dos pés, numa janela, andando entre as pessoas, seguindo as tropas.
Em casa, era sagrado, de manhãzinha:
- Mãe, vou pra parada!
Ela já sabia. E se orgulhava.
Nunca teve problema no time. Era terceiro reserva. Podia faltar.
- Dia 7 não posso, professor.
O professor já sabia. Mas não ligava. Ele nunca jogaria mesmo. Só numa catástrofe.
Era o caso agora. Titular e reserva machucados. O volante, que podia cobrir, expulso, outro com três cartões, o juvenil tinha viajado.
- O Parada?
Beque central ainda por cima. Magro, baixo, mas era onde sempre treinou.
Gostava. Achava mais imponente. Sentia-se ornado, cheio de ombreiras, galardões, medalhas e espadas, chefiando o território da grande área, comandando os laterais e o quarto-zagueiro.
Isso no infantil, nas peladas, no juvenil.
No time de cima, só treinava o físico. No coletivo ficava olhando.
Queriam dispensá-lo. Mas, caramba, o Parada era do bem. Deixa ele aí.
Uma hora ele desiste.
Mas não. E agora a situação. Sem ele, não tinha zaga pra jogar. E o jogo era que dia?
Dia 7 de setembro.
- Professor, …
- Parada, …
- … domingo …
- … precisamos …
- … não p …
- … de você na zaga!
A cabeça dele rodou. Titular? Sim. No duro? Sim. Desde o início? Sim. Vai ter foto do time antes do jogo? Sim. Braços cruzados? Sim.
A cabeça rodando. Os pratos. As cornetas. Os taróis. A grama, a grande área, a organização da tropa defensiva e do contra-ataque.
Mas – e o desfile, o aniversário, os parabéns?
Não tinha mais os ombros do pai, mas os brigadeiros que a mãe fazia, mas o bolo, mas era o dia das trompas, do apito, mas era o aniversário, o almoço, mas era dia de fitas, das fardas, de fotos, de festa e desfrute.
- De capitão, professor?
- Não, Parada. De capitão não dá.
Rodou quarteirões a pé. Chutando pedrinhas. Pensativo, cabeça baixa. Mas feliz: “que sorte! – se ele me dá a faixa de capitão, eu ia perder o desfile”.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)