19 março 2015

Craque Mudo

Tinha o Mudo. Nunca soube seu nome. Sei que mentia demais – era o que falavam os que o entendiam.
Claro, risonho, tagarelava com punhos, palmas e dedos – as vírgulas e os pontos feitos por gemidos.
Que jogara bola, fizera gols, viajara. Que conhecera craques.
Que uma vez no Rio, certa ocasião na várzea, muitos anos em Colatina, um jogaço em Manhuaçu, três petardos num amistoso, um retrato com o Vavá – e ria quando os ouvintes – ou leitores – batiam as costas da mão sob o queixo dizendo que era tudo mentira.
Uns até apontavam o indicador pro pescoço e sopravam o ar como o de uma bola quando murcha – “papo furado”, meu pai traduziu quando vi.
Barulheira de verdade era quando o Botafogo vencia.
Dia seguinte, batata: ao silêncio de todos ele impunha o gestual altissonante celebrando a estrela e as listras no peito.
(Texto de Luiz Guilherme Piva)